sexta-feira, 4 de abril de 2025

"O Setênio" por Raquel Maia Liberato

 Acabei de ler O SETÊNIO da autora Edna Domenica Merola.


Foi uma grata surpresa.

O livro me encantou pela narrativa repleta de humor, ironia, sátira e muitas vezes me peguei sorrindo durante a leitura.

Mesmo diante de um período pesado de pandemia e caos político a autora narra com maestria esses 7 anos.

Outro aspecto que me chamou a atenção, foi como Edna brinca, joga com as palavras.

Um livro que poderia ser denso e sério se tornou leve e até certo ponto divertido, tudo isso devido a criatividade da autora.

Parabéns Edna. Amei


Raquel Maia Liberato é coordenadora do GEC - cine debate do NETI - UFSC

terça-feira, 18 de fevereiro de 2025

Antonio Carlos - Tatalo - Fernandes edita "De que você gosta?" (por Tatalo, Edna, Eduardo, Gilberto, Léa, Rosilene, Taís)

  


Do que você gosta?

Antonio Carlos – Tatalo- Fernandes

 

Canto I- EU GOSTO DA NATUREZA

 

Gosto do cheiro da chuva (Rosilene)

     em uma t(ar)de de verão. (Rosilene)

Gosto do barulho do mar. (Tais)

De ver o sol nascer e se deitar. (Tais)

e ver o sol nascer e se deitar. (Tais)

Gosto de dormir com as galinhas e acordar com os galos. (Gilberto)

Gosto de receber a Lua e o Sol a cada segundo. (Gilberto)

Eu gosto do seu rosto ao vento exposto ao ar. (Tatalo)

Hum... Gosto de praia, (Edu)

de ler em frente à praia, (Edu)

Gosto de ler, de praia, de café, da voz da minha mulher... (Edu)

Sem satisfações a dar. (Tatalo)

 

Canto II- EU GOSTO DE LITERATURA

 

Gosto de livros (Edna)

De um jeito professoral (Edna)

Que afaga a escrita (Edna)

De ler um bom livro, (Azaleia)

De ler sei que gosto, muito mais do que de tantas coisas. (Edu)

e ler tomando café. (Edu)

Gosto de ouvir a Dona Irene lendo. (Edu)

Gosto de ler, de praia, de café, da voz da minha mulher... (Edu)

Sem satisfações a dar. (Tatalo)

  

Canto III-  EU GOSTO DAS AMIZADES

 

Rumo a pessoas, (Edna)

Afetivamente (Edna)

Gosto de ouvir pessoas, (Tais)

De sorrir e às vezes chorar, (Tais)

Estar entre amigos, (Tais)

Conversar, (Tais)

Gosto de rever amigos (Azaleia)

E gosto de vocês. (Gilberto)

 

Venho por trás e a abraço. (Tatalo)

Afago seu dorso com meus lábios (Tatalo)

Gosto de ler, de praia, de café, da voz da minha mulher... (Edu)

Sem iludir você (Edna)

Definitivamente, (Edna)

               Gosto. (Edna)

Sem satisfações a dar. (Tatalo)

 

Canto IV- EU GOSTO DE ME EXPRESSAR

 

Gosto de um gostar (Edna)

Que impregna o ar (Edna)

Retórica artística confessa (Edna) 

Do folhe(ar) da imagin-ação (Rosilene)

Do despert(ar) da cri-ação (Rosilene)

          Gosto (Rosilene)

                      da melodia em moviment-ação (Rosilene)

    a distribu(ir) ondul-ações. (Rosilene)

Ouvir música, (Tais)

Dançar... (Tais)

Gosto de escutar (Azaleia)

histórias, músicas (Azaleia)

De vez em quando, me perco no doce timbre da sua voz. (Edu)

Seus olhos semicerrados lhe impingem um ar de seriedade. (Tatalo)

Vejo na cena a respiração profunda e a tranquilidade. (Tatalo)

Sem satisfações a dar. (Tatalo)

 

Canto V- EU GOSTO DO TRANSCEDENTAL

 

Da ilusão do amanhã (Rosilene)

        a seme(ar)realiz-ações (Rosilene)

De ser grata (Azaleia)

 a Deus (Azaleia)

 e aos meus ancestrais. (Azaleia)

Gosto de saber que tudo é finito, pois me dá a noção maior de tudo que vivemos em paz. (Gilberto)

e procuro pelo seu ponto focal no ar. (Tatalo)

Lá está você respirando levemente. (Tatalo)

Atinge as profundezas com leveza. (Tatalo)

Sem satisfações a dar. (Tatalo)

 

Canto VI- EU GOSTO DE COMER

 

Gosto também de quiabo, jaca e jiló. (Gilberto)

Ah, também gosto de melancia e sorvete de morango. (Edu)

de tomar café, (Edu)

Sem satisfações a dar. (Tatalo)


Antonio Carlos (Tatalo) Fernandes, professor titular convidado da COPPE/UFRJ de engenharia naval e oceânica. Foi membro do GTP (Grupo Teatral Politécnico da USP). No Rio, fez curso de dança de salão com Jaime Aroxa e de declamador de poesia com Elisa Lucinda. Participa da Tertúlia Poética e dos curso de Claudio Carvalho. Participa do livro publicado “Ninguém Escreve por Mim” organizado pelo último e editado por Cassiano Silveira.

 Edna Domenica 

Paulistana, desenvolveu pesquisa sobre Psicodrama e suas aplicações em oficinas de escrita criativa, parcialmente publicadas em Aquecendo a produção na sala de aula (Nativa, 2001). É autora de A volta do Contador de Histórias ( Nova Letra, 2011), No Ano do dragão ( Postmix, 2012), As Marias de San Gennaro (Insular, 2019), O Setênio (Tão Livros, 2024).

Eduardo Martínez

Carioca, bacharel em Jornalismo, Medicina Veterinária e Engenharia Agronômica. É autor de quatro livros (Despido de ilusões, Meu melhor amigo e eu, Raquel, e o recente Contos e crônicas por um autor muito velho; além de dezenas de coletâneas. Escreve diariamente para o site de notícias Notibras. 

Gilberto Motta: circense, jornalista, professor-mestre e aprendiz da vida. Rodou mundos e hoje escreve em paz em um chalé na Guarda do Embaú SC.

 Azaleia ou Soulea (Léa Palmira e Silva) é manezinha (nasceu na capital de SC). Em 2013, participou do concurso de Narrativas e Poesias do Sindprevs/SC e, em 2018, do Concurso Literário da Academia Criciumense de letras -ACL.

Fez o curso de Contadores de Histórias no Neti, em 2001, Oficina de Teatro da terceira idade do Neti -UFSC . E Oficina de Escrita Criativa com a Professora Edna no Neti/UFSC.

Foi integrante da ABCH de 2015 a 2023 . E da ACONTHIF desde 2001. Participa do Projeto anti-racista Retintas 1 e 2 com poemas. 

 Rosilene Souza 

Mineira, desenvolve pesquisa nas linguagens artísticas: colagem, escrita criativa, fotografia e deficiência visual. Investiga o excesso de imagens e escritas consumidas e produzidas na sociedade. Participa de exposições, feiras e mostras de Arte. Tem trabalhos artísticos e literários publicados em revistas, livros (coletâneas "Do corpo ao corpus, organização Edna Merola, 2022", "Ninguém escreve por mim, organização Claudio Carvalho, 2024"; catálogos e blogs. Contos e ilustrações publicados pelo Café Literário no Notibras (2025). 

Taís Palhares

Paulistana, participou do Ateliê de Escrita da Biblioteca do CIC - Floripa, SC - em 2019. É leitora de ficção que sabe o que quer. Participou do Café Literário com os títulos: Daqueles tempos distantes como "Baby, eu sei que é assim" e "Do interior para a senzala da cidade... e um bebê do patrão".       

sábado, 1 de fevereiro de 2025

O lado B da escritora de textos ficcionais. Edna Domenica Merola

Ser escritora de ficção, no Brasil é algo situado longe de único ganha pão. Até os anos 1980, os livros paradidáticos foram uma renda extra do orçamento de alguns professores paulistanos que conheci lá e então, no exercício dos papéis de professora de Língua Portuguesa e coordenadora pedagógica. 

De 2011 a 2024, consegui publicar dez livros de ficção e permanecer no anonimato. 

Meu papel de escritora de ficção tem seu lado B que é o de participar de encontros de leitura de textos de autores presentes. Esse lado B, caso haja interesse, organiza coletâneas com outros autores a partir de um tema. O processo de criação de cada um é beneficiado por encontros via “lives” nos quais lemos e comentamos nossos textos. As publicações são “bancadas” pelos próprios membros que se comprometem a comprar pelo menos uma cota de exemplares. Os trabalhos de capa e de diagramação algumas vezes são feitos por participantes do próprio grupo, outros são remunerados. Os custos de ficha catalográfica, ISBN e impressão são facilmente contratados numa gráfica.

Sei que meu lado B é anarquista. Mas valorizo o trabalho de editoras e avalio as dificuldades que enfrentam para se manter num país em que a maioria vota em candidatos que propagam o desprezo pela pesquisa, pelos professores, pelas instituições como a escola pública laica, civil e de qualidade e a universidade pública com cotas para os povos originários e prova do ENEM.

Repito que “sei que meu lado B é anarquista”. E que busca fundamentos teóricos no Psicodrama.  Em 2004, defendi a dissertação de Mestrado – Psicodrama e psicodramatistas no Brasil:  1963-2003 – que tem por mote a análise das publicações brasileiras sobre Psicodrama. Em sua maioria, tais livros foram lidos pelos alunos de seus autores. 

Sei que meu lado B é puro idealismo utópico que se consolida na prática de ensinar/aprender sem custos monetários institucionais à revelia da idade de quem aprende-ensina, apesar do etarismo. E continuo cantando "apesar de você, amanhã há de ser outro dia". 

 

 

 

sábado, 28 de dezembro de 2024

Escritora Edna Domenica em retrospectiva 2024

 


Escritora Edna Domenica em retrospectiva 2024

Eventos

1- Lançamento do livro O setênio na FECESC em 12/07/2024

Av. Mauro Ramos, 1624. Centro Norte, Florianópolis, SC

2- Sessão de autógrafos do livro O setênio na livraria Desterense (Rua Tiradentes, Centro. Florianópolis, SC) em 20/07/2024.

3- Roda de Conversa sobre Produções do período 2017-2023 na livraria Latinas (Rua Padre Lourenço Rodrigues de Andrade, 650. Santo Antonio de Lisboa. Florianópolis, SC), em 23/11/2024.

Entrevistas no Café Literário Notibras

30/09/2024 - Amigo invisível se transforma no ato de escrever. Cecília Baumann entrevista Edna Domenica

21/11/2024 - Divulgação da Roda de Conversa com Edna Domenica Merola, por Cecília Baumann. 


Publicações no Café Literário do Jornal Notibras

18/09/2024 - Se Deus quiser ainda vamos bailar muito, Soledad - MEROLA, E. D. Pronto final, in O Setênio. Palhoça: Tãolivros, 2024, pp 31-32.

23/09/2024 - Tempo corre até a hora de ser feliz sem medo - MEROLA, E. D. Casaco vermelho, in O Setênio. Palhoça: Tãolivros, 2024, pp 33-34.

13/10/2024 - Rei, capitão, soldado, ladrão (e sem coração) - MEROLA, E.D.  in O Setênio. Palhoça: Tãolivros, 2024, p 74.

31/10/2024 - Madeixas de Doralina tinham o brilho da alma de uma criança. - Coletivo Antonio Gil Neto, Cassiano Silveira, Edna Domenica, Marlene Xavier Nobre.  Corpo a corpo, in Do Corpo ao Corpus. Palhoça: Rocha, 2024, pp 21-23.

07/11/2024 - De Chicos a Dorothy, crimes não compensam e sempre rendem punição. MEROLA, E.D. As Marias de San Gennaro, pp 27-28.

09/11/2024 - O que São Genaro previu? É bom levar a coisa a sério. MEROLA, E.D. As Marias de San Gennaro, pp31-33.

20/11/2024 - Do interior para a senzala da cidade... e um bebê do patrão.  - texto inédito do coletivo Brígida Poli, Edna Domenica e Taís Palhares.

03/12/2024 - Tresloucado amigo! Afinal, que procuras com elas? - texto inédito de Edna Domenica. 

06/12/2024 - Escola de politicagem continua viva embrulhada em negociata - MEROLA, E. D. Evento Pop, in O Setênio. Palhoça: Tãolivros, 2024, pp 31-32.

07/12/2024 - Daqueles tempos distantes com Baby, eu sei que é assim - texto inédito do coletivo Brígida Poli, Clara Amélia de Oliveira, Edna Domenica e Taís Palhares.

25/12/2024 - Que tal Pai, Mãe, Água, Terra e Fogo e revigorar o ar todo? - Segunda Coletânea de Natal. São Paulo: Projeto Apparere, Natal para 2020, p 58.

30/12/2024 - Da doméstica, da rainha, da mãe e da amiga de Jesus... E da diarista - MEROLA, E.D. História de Maria, in A volta do contador de histórias. Nova Letra: 2011, pp 97-108.


Agradecimentos à equipe do Café literário 

Eduardo Martínez, Cecília BaumannDaniel Marchi


Agradecimentos aos amigos

Lael Nobre pelo apoio logístico no lançamento de O Setênio na FECESC, em 12/07/2024.

Brígida Poli pela divulgação da Roda de Conversa no Portal Making Of, em 23/11/2024.

Rosilene Souza pelas leituras e trocas, e, em especial, pela ilustração do conto Casaco Vermelho.

sexta-feira, 2 de fevereiro de 2024

Oficina de Leitura reflexiva do texto para teatro O crush da professora "Z" Maria de Edna Domenica Merola

 26/04/2022

 

O crush da Professora “Z” Maria

 

Tendo por chave o Teatro do Absurdo, relembro A Cantora Careca, de Ionesco, e pretendo compartilhar minhas rflexões sobre um segmento de falas dos personagens Capitão e Senhor Martin.

Para representar a quase extinta ala utópica das reflexões, convoco a Professora “Z” Maria. Ela é da minha turma de amigas nascidas entre o final da década de 1940 e início de 1950, batizadas de Maria como segundo nome, professoras devotas de San Gennaro (um napolitano que morreu de emboscada!).

Chamo ainda a Sra. Dá Ares, só para dar um tom de malfadada verossimilhança à representação.

O segmento de falas alvo (uma do Capitão e outra do Sr. Martin), conforme escrito por Ionesco, consta a seguir:

CAPITÃO: Falo de minha própria experiência. A verdade, nada mais que a verdade. Nenhuma ficção.

SR. MARTIN: Isso mesmo. A verdade nunca é encontrada em livros, somente na vida.

Invento o que prossegue:

DÁ ARES: Há livros e livros. Na Bíblia, só há verdades. No entanto, nos livros escolares, principalmente os de História e de Sociologia, nunca a verdade é encontrada.

CAPITÃO: A minha própria experiência é propriedade exclusivamente minha. Não foi de outrem que me antecedeu.

PROFESSORA “Z” MARIA: Então, se nada ocorre por herança, posso concluir que o pai e a mãe do Capitão (com o devido respeito a ambos!) são personagens ficcionais?

CAPITÃO: Dá Ares, tem como exorcizar essa bruxa comunista?

DÁ ARES: Antes, vou tentar explicar. No mundo real existe experiência azul e experiência rosa. Já a vermelha é mera ficção.

PROFESSORA “Z” MARIA: Sr. Martin, se não existe verdade em nenhum livro, posso concluir que o senhor é ateu?

SR. MARTIN: Por favor, Capitão. Dá pra enquadrar essa Professora? Dá Ares, explica pra ela que não existe ficção no nosso gerenciamento e que experiência é técnica, é know how. Experiência não é concupiscência! (Sr. Martin olha com ar repreensivo para a Professora “Z” Maria.).

PROFESSORA “Z” MARIA: Caro Senhor Martin, a experiência poética também não é concupiscência. Vou apresentá-lo ao poema Transfusão (MEROLA, 2010).

 

          Teu corpo é aurora no campo orvalhado,

          é relva macia, é feno molhado,

          é favo de mel.

          É santuário de essência imortal,

          é depositário de fluído extrassensorial,        

          é início de uma escalada dolorida,

          é fim e princípio de vida.

          Teu corpo, moreno, é pôr do sol,

          é lusco-fusco vestido de translúcida fantasia,

          é convite para uma noite de orgia,

          é delicada concupiscência e estranha nostalgia.

 

          Teu corpo visto de longe... Tudo bem!

          Teu corpo sentido de perto é um vai e vem!

          Mas que estranha irradiação é essa

          que estonteia?

          Que doce troca magnética é essa

          que se esparge?

          Só sei que, de repente,

          frio e calor tornam-se morno,

          verde e amarelo dão azul...

          E, na dança de dois corpos,

          funde-se uma aura unicolor.

 

SR. MARTIN: Dá Ares, tem como dar um jeito nessa messalina comunista?

DÁ ARES: Amigos, a Professora “Z” Maria usa roupa de cor vermelha. O vermelho é de esquerda! A esquerda é do demônio.

SR. MARTIN (interrompendo Dá Ares): Logo, a Professora “Z” Maria é do... (aponta para o público)

DÁ ARES: É do... Vamos participar! (aponta para o lado direito da plateia). Aqui, todos da ala direita!

CAPITÃO: É do... (faz gesto de arma apontada). Se não completar vai se danar! (aponta para um grupo específico do público).

PROFESSORA “Z” MARIA: Capitão, Sr. Martin, Dá Ares, deixem de me tratar como morta. Deixem de falar sobre mim e falem comigo. Não há nada mais eficaz pra deprimir alguém do que lhe dizer (ainda que sem palavras) que ela não está presente, que não existe. Li no livro do Buber que isso se chama desconfirmação.  Mas, antes de ler, já havia experimentado na própria pele.

Eu reivindico ao menos uma oposição. Que possamos dizer um ao outro: “eu tenho minhas experiências, você tem as suas, se elas sintonizarem é ótimo, senão, nada há a fazer”.

DÁ ARES: Capitão, tem como prender essa bruxa anarquista?

PROFESSORA “Z” MARIA: Dá Ares, você precisa de ajuda especializada. Experimentou certas situações no passado que hoje a impedem de participar da experiência compactuada. Chamamos a experiência compactuada de realidade. Por exemplo: a fórmula da água é H2O.

CORO (Capitão, Sr. Martin, Dá Ares): É nada! Isso é tudo fake da esquerda!

DÁ ARES: Eu tive uma experiência na árvore!

CAPITÃO, SR. MARTIN: Todos os brasileiros de bem são testemunhas de que você teve uma experiência na árvore!

PROFESSORA “Z” MARIA: As narrativas tais como os mitos fundadores fazem parte da realidade compartilhada, mas que um dia foram ficcionais.

DÁ ARES: Mito fundador é coisa de cumunista! A mitologia grega é de esquerda. Acupuntura, ioga, Reik, constelação familiar, dieta vegana é tudo de esquerda. O comunismo começou com a Revolução Francesa, liderada por Eugène Ionesco...

SR. MARTIN (Interrompe Dá Ares. Pigarreia para pedir a vez de falar). A Professora “Z” Maria é uma mulher que deseja ter certas experiências!

DÁ ARES: Hunh, hunh! Na experiência da árvore, me foi revelado que ela teria um caso com esse tal de Ionesco. E que isso seria péssimo para o país.

CAPITÃO: Melhor prender esse Ionesco aí e essa professora daí!

 

Aspectos a considerar sobre o texto para teatro.

Edna Domenica Merola

 

O texto para teatro é escrito geralmente em prosa, apresentando enredo e personagens. Tem por função ser representado e por característica principal o diálogo entre os personagens (discurso direto), pressupõe a separação entre plateia e palco, mas utiliza linguagem dialógica. Apresenta um conflito que será resolvido no decorrer dos diálogos verbais e gestuais.

Seus elementos são: tempo, espaço e personagens.

O tempo teatral compreende o tempo real ou da representação, o tempo dramático ou dos acontecimentos narrados, e o tempo da escrita.

O espaço em teatro trata do espaço cênico ou da representação, por um lado, e do espaço dramático ou local em que se passam os fatos narrados pelos personagens.

Os personagens dos textos teatrais são: protagonistas, secundários e figurantes.

 

Referência

Daniela Diana. Texto Teatral. Disponível em

https://www.todamateria.com.br/texto-teatral/

 

Questões para reflexão

Qual é a tônica do diálogo entre os personagens? No texto há hierarquização de personagens (protagonistas, secundários e figurantes)?

Qual é o espaço dramático de O crush da professora "Z" Maria?

Em quais aspectos o espaço cênico pode ser visto como tribuna?

 

O que a intertextualidade em O crush da Professora“Z” Maria pode evocar em relação ao tempo da escrita, ao tempo  dramático e à veracidade do caso entre a professora (personagem) e o dramaturgo francês Ionesco (que como personagem é inexistente)?

 

“Há muitas formas de um texto se referir a outro: paródia, pastiche, eco, alusão, citação direta e paralelismo estrutural. Alguns teóricos acreditam que a intertextualidade é a própria condição da literatura – que todos os textos são tecidos com os fios de outros textos, independente de seus autores estarem ou não cientes.” (LODGE, 2011, p. 107).

A intertextualidade implícita exige um esforço maior de análise do leitor que  não recebe informações sobre o texto fonte. Já na intertextualidade explícita, há indicação da fonte.

 

Referência

LODGE, David. A arte da ficção. Trad Bras Guilherme da Silva Braga. L&PM Pocket, 2011.

 

Você considera esse texto cômico, trágico ou tragicômico?

 

A tragicomédia foi amplamente difundida no teatro clássico, e caracteriza-se pela combinação de elementos dramáticos e cômicos.

O lado cômico da tragicomédia expressa rejeição, mostrando algo com deboche, recorre à paródia, na qual recria-se um personagem ou um fato de maneira grotesca.

Na Grécia Antiga, a tragicomédia utilizava o coro para comentar as cenas e representar o público na participação da peça teatral.

Geralmente há um herói que age em prol da justiça social e depois de muito sofrimento tem um final feliz.


Referência

Editorial QueConceito. São Paulo. Disponível em:

 https://queconceito.com.br/tragicomedia. Acesso em: [21/02/2022]


sexta-feira, 19 de janeiro de 2024

Entre quatro paredes. Edna Domenica Merola

Ele bateu à porta por volta das 18 horas. Ela não abriu. Mesmo se tratando de um condomínio com portaria 24 horas, ela ponderou que pudesse ser um estranho.

 

A senhora perguntou quem era e o que ele queria. Uma voz que não transmitia conforto respondeu que era o vizinho e que vinha para perguntar se ela fazia uso de incenso e se arrastava cadeiras.

 

Foi então que ela abriu a porta, exibiu seus cabelos brancos, sua bengala e (por que omitir?) certa vitalidade na comunicação.

 

Disse-lhe que a bengala, com certeza, fazia barulho, que dormia bem e que portanto os ruídos seriam ouvidos apenas durante o dia, mas que continuariam ocorrendo já que não podia prometer que sua fada madrinha iria fazê-la acordar, no dia seguinte, sem as limitações das quais padecia.  

 

Quanto ao incenso, respondeu ao moço que não usava (nem acendia velas), que não praticava nenhum ritual no apartamento. 

 

Acrescentou ter ouvido queixas de outros moradores em relação a cheiro de maconha. Perguntou se as suspeitas dele sobre o uso de incenso se dirigiam a "fumantes". Ele disse que sim.

 

Nessa altura, ela pôs a cara em direção ao corredor e ergueu a voz ao dizer:

- Não uso maconha, à revelia de que poderia fazê-lo, já que tal uso tem indicação para artrose, doença crônica da qual sofro.

 

A idosa prosseguiu com seu discurso indignado. Mas, quanto mais ela falava, mais o moço repetia suas acusações. Da soleira da porta do apartamento dela, o estranho podia ver uma mesa com quatro cadeiras na sala. Apontou a que ficava na posição tal que quem nela sentasse ficaria de costas para a porta, indicando que o barulho partia de lá. 

Ela respondeu que nunca sentava daquele lado.

 

Quando ele foi embora, ela aquilatou que falara demais. Com seus blefes, o caçador aumentara os informes sobre sua caça.

Entre pensamentos esparsos da idosa, foram aparecendo novas perspectivas sobre a cena do visitante indesejado. Cada vez que ela passava perto das cadeiras ao redor da mesa, imaginava como seria recobrar o vigor para batê-las com força no chão.

 

E o hábito de bater talheres na louça, por que nunca tinha tido, durante toda a vida? Ainda poderia adquiri-lo...

 

E mesmo estando sozinha nas refeições, poderia gritar:

 

- Passa o sal, por favor!

 

Ou melhor:

 

- Porra meu, passa esse sal logo!

 

Superada a fase de refletir sobre comportamentos, novos sentimentos sobre o outro foram aflorando.

 

O primeiro foi o de indignação por ter sido tachada injustamente de maconheira. O segundo foi o medo de que o estranho vizinho traçasse planos de vingança pela falta de receptividade por ela sinalizada. Indignação e medo redundaram na instalação da presença invisível e dominadora do novo vizinho em sua sala, em seu apartamento, em sua vida. Em pouco tempo, consolidou-se a sensação de sobreviver num território invadido. Passara a ser sem pátria dentro de sua própria casa!

 

Teve necessidade de se voltar para fora: conviver com o campo visual dado pela varanda. Tratava-se de um cenário verde a que todos deveriam ter direito...

 

Começou a reparar: havia sim um cheiro de queimado que vinha pela sacada do apartamento. Passou a procurar insistentemente por quem se dispusesse a localizar quem queimava lixo no bairro.

 

Desgastou-se. 

 

Para tentar superar, passou a coletar frases de auto ajuda. Muitas giravam em torno de “o inferno são os outros”. Muitas deturpavam o sentido da tal frase colhida da boca de um personagem da peça "Entre quatro paredes" escrita por Sartre no final da chamada segunda guerra do século XX, na qual o inferno é uma sala sem espelhos onde os condenados só podem se ver por meio dos olhos dos outros. 

E foi naquele mundo de auto ajuda que ela viveu, longe de seu vizinho, até o 

FIM

 

Caro leitor, cara leitora, responda a quem narra esta história: "tal política de vizinhança causará a extinção do planeta Terra?"

 

"O Setênio" por Raquel Maia Liberato

 Acabei de ler O SETÊNIO da autora Edna Domenica Merola. Foi uma grata surpresa. O livro me encantou pela narrativa repleta de humor, ironia...